Outro dia eu estava em um show underground e presenciei a seguinte cena: um adolescente estava vestindo uma camisa do Enthroned e uma bermuda meio colorida. Estava esquisito e, é claro, não combinava muito. A bermuda foi o motivo para que um amigo meu o abordasse dizendo que aquela combinação era ofensiva ao metal extremo da década de 80. Que quem ouve Enthroned não pode usar bermuda. O cara ficou mais assustado do que ofendido, tanto que queria chamar a polícia bem no meio do show.
Depois do incidente fiquei comentando com esse amigo sobre o Brian Robertson, guitarrista que substitui o Fast Eddie Clarke no Motörhead. Diz a lenda, e eu assisti a uma entrevista do Phil Animal Taylor que confirma, que ele foi demitido da banda pela mania insistente de usar bermudas nos shows. Tocava bem, mas aquele visual não condizia com a postura da banda.
Outra história que sempre ouvi conta que o grande guitarrista Hank Shermann teria arrumado uma grande briga com o King Diamond por insistir em usar roupas brancas no palco. A lista de casos assim que já ouvi é enorme, e pensando sobre isso resolvi escrever sobre o radicalismo no meio metal.
O Heavy Metal nasceu como um estilo contestador, sem preocupação com os padrões estéticos. Isso vale não só para o estilo original das bandas dos anos 60/70, mas também para outros momentos em que o metal foi reformulado, por exemplo na ascensão do thrash no meio dos anos 80. Não interessava, nas duas épocas, a estética dominante ou a moda. As bandas de metal faziam o que queriam, sem preocupação de agradar a ninguém, e mais, adotando atitudes propositalmente ofensivas. Assim foi com o as letras e estética satanista exploradas pelo Black Sabbath, pela sonoridade agressiva das primeiras bandas de black e de thrash, pelo corpse paint, etc.
O fato é que as grandes bandas de heavy metal sempre se envolveram em polêmicas em que alguém se sentia ofendido por algum elemento do estilo. Desde coisas triviais como os cabelos longos até atitudes muito mais polêmicas como Glen Benton que marcou na carne uma cruz invertida com metal incandescente.
O que é contraditório, e às vezes soa engraçado, é que é muito comum que os próprios fãs se sintam ofendidos por algumas atitudes inovadoras dos artistas. O estilo que nasceu revolucionário tem um público muito conservador em relação aos padrões musicais e estéticos comuns no meio metal. É um sentimento que muitos definem como "traição", mas eu acho que é mais parecido com uma rejeição a coisas novas, como se o fã exigisse do artista que fizesse sempre o mesmo som, repetisse sempre a mesma fórmula que o consagrou. E, como é evidente que a arte não conhece limites, o artista geralmente cai na desgraça entre os próprios fãs.
Isso aconteceu com quase todas as bandas que mudaram seu som ao longo da carreira. Claro que algumas mudanças foram um desastre total, e se fizeram com que as bandas em questão ganhassem novos fãs fora do meio metal, causaram uma decepção inesquecível aos seus fãs mais antigos.
O melhor exemplo é o falecido Metallica, que a cada disco lançado ofende todos os que começaram a ouvir a banda pelos discos gravados nos anos 80. Embora eu ache todos os discos desde o Black Album uma tremenda porcaria, eu me sinto muito mais ofendido pelas idiotices que a banda sai por aí dizendo (tipo "o heavy metal está morto", que eu ouvi o Lars Ulrich dizer numa entrevista à MTV) e muito menos pela qualidade sofrível das músicas.
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